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Para ajudar a entender o que aconteceu com o Vitória até o rebaixamento na Série B, o ge conversou com profissionais que viram a crise dentro da Toca do Leão. Foram diversos os depoimentos, mas ganharão destaque os que foram confirmados por mais de duas fontes. E os nomes delas serão preservados.

Paulo Carneiro, presidente afastado do Vitória, e o empresário Israel Bodziack são citados e, por isso, foram procurados pela reportagem. Ambos disseram que não iriam se manifestar sobre os assuntos abordados.

A estreia do Vitória na Série B de 2021 aconteceu no dia 28 de maio, mas o time caminhou para a Terceira Divisão muito antes disso. A disputa pelo poder dentro do clube criou um ambiente instável e de pressão, que culminou com cinco presidentes diferentes no últimos seis anos (veja abaixo o que dizem alguns desses gestores sobre o rebaixamento). A turbulência nos bastidores foi refletida dentro de campo, e o time que disputava a Série A em 2017 chegou à Série C em 2021.

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Nos relatos ouvidos pelo ge, as maiores críticas dizem respeito ao trabalho de Paulo Carneiro, presidente eleito em abril de 2019 e afastado em setembro de 2021 sob acusação de gestão temerária.

O presidente afastado também comandava o Rubro-Negro no primeiro rebaixamento para a Série C, em 2005, e retornou à presidência com a promessa de gestão profissional e união em busca da reestruturação do clube. Contudo, o gestor entrou em atrito com ex-presidentes que formavam sua base de apoio, se isolou e não conseguiu resultados expressivos dentro de campo.

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Segundo relatos, o presidente afastado acompanhava de perto os treinos do Vitória e, ao tentar interferir, gerava mal-estar em algumas atividades. Era comum ver Paulo Carneiro dentro de campo, passando orientações aos atletas.

"Ele estava praticamente dentro de campo. Olhando o treino e se metendo no que estava acontecendo. O lateral passava e ele gritava: ‘Ei, você não pode subir assim’. Isso aconteceu várias vezes”, conta uma das fontes ouvidas pelo ge.

Houve um episódio em que uma atividade foi interrompida até que presidente deixasse o campo.

– Os jogadores tiveram que intervir para continuar – relata.

Também foram comuns os relatos de “carga pesada do vestiário” do Vitória. Paulo Carneiro fazia cobranças públicas aos jogadores, e um episódio na derrota para o Vasco, no Barradão, no dia 2 de agosto, foi criticado. Nessa partida, o time era comandado de forma interina por Ricardo Amadeu, já que Ramon Menezes tinha sido demitido.

– O jogo contra o Vasco teve bastante chuva e foi paralisado. Só que, nisso, a gente já tinha tomado um gol. Quando a gente entrou no vestiário, Paulo Carneiro chegou lá. Ele já entrou falando: "Sabe por que a gente tomou o gol? Porque não tinha ninguém marcando". Eu nunca tinha visto isso. Um presidente entrar no vestiário e tomar o lugar de fala do treinador – completou o jogador.

"Ele atropelou o treinador. Não existia um comando ali, não existia respeito”, disse um atleta.

O perfil ríspido de Paulo Carneiro, seja com funcionários, jogadores ou membros da comissão técnica, desagradava algumas pessoas. Um atleta, inclusive, chegou a cogitar não entrar mais em campo enquanto o gestor estivesse no clube.

– Destratava alguns jogadores na frente de todo mundo. Teve um jogo do Campeonato Brasileiro que um jogador brigou com ele e disse que não ia entrar em campo. Passou o dia da partida todo dizendo que não ia jogar, e só jogou porque teve que todo mundo ir convencer ele.

A situação delicada na Série B fez o Vitória adotar mudanças no elenco na reta final da competição. Em outubro, diretoria e comissão técnica decidiram afastar oito jogadores sob a justificativa de que existia um elenco extenso e que era necessário dar prioridade aos atletas que apresentaram melhor rendimento.

Segundo relatos, o grupo inchado era um problema dentro e fora de campo.

– Com essa quantidade, você não consegue agradar todo mundo. É complicado. Querendo ou não, um grupo muito cheio gera muita conversa dentro do vestiário. Você fica sabendo que tem gente falando mal um do outro. Um querendo o lugar do outro. Gente falando mal de treinador também. Foi um período bem difícil. Até que o pessoal conseguiu separar o grupo.

Não era somente a interferência de Paulo Carneiro que incomodava no Vitória. A presença do empresário Israel Bodziack, até dentro do vestiário em algumas ocasiões, gerava desconforto a algumas pessoas.

– Eu não sei nem o que é que ele trabalhava no clube. Os meninos chamavam ele de 'Mohamed'. Esse cara vivia na Toca do Leão. Frequentava todos os dias. Inclusive entrava no vestiário em alguns momentos. Um cara que não fazia nem parte do clube, não tinha uma função, vivia ali dentro. Ninguém gostava.

Oficialmente, Israel não exercia qualquer cargo diretivo dentro do Vitória.

– A gente se perguntava como aquele cara estava dentro do Vitória, resolvendo questões de transferência de jogador. Então, assim, não tem como você entender. Não tem como achar que ele vai resolver alguma coisa de jogador. Todo mundo ficava com um pé atrás – completa.

O tema salário foi comum na Toca do Leão ao longo de toda temporada. Foram recorrentes os atrasos nos pagamentos de jogadores ou funcionários, e o conhecimento sobre o adiantamento do salário de Paulo Carneiro gerou desconforto dentro do clube. Esta foi uma das irregularidades apontadas em parecer da Comissão de Ética.

– Um cara que adianta o próprio salário e tem coragem de cortar o salário dos funcionários, que ganham um salário mínimo. São coisas que a gente sente porque estamos ali no dia a dia do clube – relatou uma das fontes.

– É difícil. Todos tiveram salários reduzidos, e o dele não foi. É um dos exemplos. De todos os profissionais. Já se comenta o erro daí. Em uma hora, a bomba estoura – disse outra pessoa.

Em entrevista ao ge no fim de novembro, Paulo Carneiro justificou o adiantamento como manobra combinada e legal dentro do Vitória.

A turbulência nos bastidores afetava o ambiente no Vitória. Para algumas pessoas, havia um clima de desmotivação na Toca do Leão.

– O Vitória deixou de ter o brilho, as pessoas não se sentiam mais motivadas dentro do clube para trabalhar.

Com o Vitória imerso em tantos problemas, o rebaixamento para a Série C era um destino que sempre se apresentou como inevitável. Faltava apenas definir o dia e lugar. Resta ao clube agora tentar se reerguer mais uma vez. Não se sabe com quanto dinheiro, qual técnico ou que presidente. Mas vai sobreviver porque mostrou, nas últimas rodadas da Segundona, que nem mais o duro golpe o afastou da torcida, único patrimônio não arruinou nos últimos anos.